Eu passei pela porta de um dos poucos cinemas que ainda existem fora das quatro paredes de um 'shopping' e fiquei pensando há quanto tempo eu não ia a um cinema. Não soube dizer quando; só sei que faz mais de ano. Talvez mais de dois.
E eu, que gosto muito de cinema desde que me entendo por gente a ponto aspirar ser um profissional da área, por que esse aparente desinteresse?
Uma das possibilidades era o preço do ingresso; outra, a segurança, a favor e contra, avaliando-se os cinemas em 'shoppings' e os de 'porta de rua'; uma outra, a qualidade dos filmes.
Fico com esta última.
Nas leis econômicas, há o conceito de
preço e o de
valor.
Preço é quanto se deseja cobrar por alguma coisa, ou pagar, dependendo de sua posição como um dos intervenientes no negócio;
valor, é o que as forças econômicas dão como resposta à satisfação desejada por ambas as partes.
Suponhamos que haja apenas três pessoas no mundo: você, uma outra pessoa física e uma pessoa jurídica.
No nosso cenário, o objeto de desejo das pessoas físicas é um automóvel. Você deseja adquirir um automóvel, por exemplo, por R$ 1,00. A montadora quer vendê-lo por R$ 100.000,00; o mesmo veículo material.
Seu concorrente, entretanto, se dispõe a pagar R$ 30.000,00, o que lhe tiraria da competição.
Pelo outro lado, a montadora, à falta de outros interessados, baixa seu preço para R$ 30.000,00 e, assim, estabelece-se o
valor.
Ou seja,
valor depende de duas ou mais pessoas; depende do mercado.
Preço? É somente um referencial, um ponto de apoio sobre o qual o consumidor/fornecedor se candidata à satisfação de seus anseios consumistas.
Portanto, valor é o preço que satisfaz a todos os agentes do negócio.
Mas, para que tudo isto?
A causa de minha ausência das salas de cinema, e a de muitos, na minha percepção, é o valor dos filmes.
O preço é caro, pois não traduz o valor que deveria satisfazer a ambas as partes; atenderia, possivelmente, a Hollywood, mas não a mim. E acho que a muita gente. Parece-me evidente que os cinemas não andam lotados. Já, já, terão de, pelo menos no Brasil, baixar o preço, a fim de satisfazer a vontade de faturar e a vontade de consumir.
E por quê?
A verdade é que a qualidade dos filmes não justifica o preço de entrada.
Antes, os filmes tinham encanto. Neles, buscava-se o sonho, a ilusão ou a diversão às durezas da vida. Transportávamos-nos à tela e nos vestíamos de personagens fascinantes.
Com o advento das técnicas voltadas exclusivamente à plástica móvel, os tão-falados efeitos especiais, os grandes estúdios retiraram, à revelia dos expectadores - e hoje apenas espectadores -, a essência da magia, que era o desnude do personagem, o de nossa empatia onírica.
Através da construção, dedução, do anseio, da busca pelo eco de nossa própria personalidade em comparação à do protagonista do filme escolhido, tínhamos o prazer detetivesco de nos descobrirmos.
O moderno detalhamento de efeitos, de precisão sub-atômica na qualidade da imagem, fez com que os produtores se sentissem descompromissados com a qualidade emocional das novas películas, de tocar o nosso espírito, roçar nossa sensibilidade através de uma obra emocionante do ponto de vista humano.
Há robôs amiúde, máquinas demais, monstros em excesso; e humanidade de menos.
Não obstante, como novidade, valeram bastante as pirotecnias iniciadas com Guerra nas Estrelas, de George Lucas, em 1977, mas o ciclo terminou com Titanic, de James Cameron, exatamente vinte anos após a trilogia espacial.
Poderíamos pensar que o cinema perde em interesse diante das facilidades de se ver um filme sob as cobertas com a amada - vizinha de cotovelo -, com pipoca e guaraná - além da facilidade de se congelar o DVD para fazer
otras cositas más...
Mas não é.
Seria, caso o sabor que se obtém de um bom filme fosse determinado pelo meio de reprodução, se em celulóide ou pelo hermético plástico da mídia circular, digital.
Não. Por sua natureza gregária, o homem precisa de mais.
A sala de cinema é um evento social e, portanto, multiplicador de sensações. Se riem, nos perguntamos o que foi que perdemos para não acharmos tanta graça; se rirmos e
eles não, por que
pagamos mico por sermos simplórios?; se acharmos graça todos juntos, que satisfação por estarmos integrados e convivas!
Há muito que não nos oferecem isto.
Infelizmente, não é uma doença apenas da sétima-arte, não; vejam os livros em profusão que falam da gente da ásia central.
A maioria trata de temas que prometem a mística do oriente, mas nem de longe trazem à luz inovações que possam raspar os contos das mil e uma noites. São, via de regra, imediatistas, superficiais, verdadeiras máquinas caça-níqueis.
Cá, em terra brasiliensis, há os livros de auto-ajuda que, por excesso, não mais ajudam quem os escreve, pois fica difícil vender quando há a quantidade absurda de títulos sobre o tema. Todos querem ganhar dinheiro facilmente, inclusive quem compra os que tratam de conselhos financeiros.
Nas diversas faces da literatura, acho que por volta de 2000, Paulo Markun, por exemplo, publicou uma pseudo-biografia de Anita Garibaldi. Por falta de material e por excesso de interesse financeiro, Markun publica a biografia de Giuseppe Garibaldi e diz que é de Anita, para nos enganar. Me enganou pela metade, pois outra pessoa comprara o livro. Ruim para ambos, entretanto.
Paulo Coelho, por sua vez, segue ganhando muito: bom para ele.
Enfim, meus amigos, digam-me: encontraram arrebatamento a preço mesmo irreal? Degustaram um bom filme nos últimos anos? Um bom livro? Emocionaram-se com alguma obra cinematográfica? Leram algo que realmente, ao fechar a última página, lhes deixassem com o olhar perdido, ainda vagando nas pradarias das folhas deixadas para trás?
Se tiveram tais momentos, ótimo! Espero estar errado aqui, de cabo a rabo.
E, por favor, me informem!
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