Deu no The Times, de Londres, em 18/11/1889, uma segunda-feira.
A reportagem é de um correspondente do jornal inglês na capital francesa, relatando uma entrevista que tivera com um antigo integrante da corte de Dom Pedro II, entre outras notícias veiculadas em outros países.
Traduzi pelo que sei de inglês, mas não ponha a mão no fogo por mim, ao acreditar no que fiz. Você mesmo pode tirar a teima, clicando no título deste artigo, que o remeterá ao jornal, onde poderá verificar o texto no original.
As palavras entre colchetes são interpretações minhas.
Acredito que o entrevistado na primeira parte era o Barão de Penedo.
Uma observação e uma curiosidade: o Barão de Penedo estava em Paris, segundo depreendo de minhas pesquisas, como representante da Feira Universal de Paris, quando foi inaugurada a Torre Eiffel, em 1889.
Eis as notícias, em itálico, abaixo:
Eu tive uma conversa com um brasileiro de alta posição, com o qual encontrei-me anteriormente com Dom Pedro II. Profundamente conhecedor de seu país e mesmo fortemente ligado ao imperador e sua família, julga os fatos com grande imparcialidade.
"A única coisa que me surpreende" - ele disse - "é que o evento [da proclamação da República] não se deu de noite para o dia. Por mais de sessenta anos, temos estado em latente revolução. Desde 1835, imediatamente após a proclamação de Dom Pedro II, da primeira regência de Diogo Feijó, da de Araújo Lima [Marquês de Olinda] até a presente data, o Brasil não foi outra coisa senão uma federação, constantemente em conflito, e composta de partes rivais aspirantes à supremacia.
Ocupamos um território quinze vezes maior que a França e não temos um-quarto de sua população. Como poder-se-ia esperar que um império poderia manter-se unido sob tais condições?
Já se viu que nossa antiga capital, Bahia, afasta-se do movimento do Rio. Verá que o império, que é tão vasto e tão pouco habitado, se dividirá cercado por várias repúblicas, o que fará aumentar o número de revolução periódicas na América do Sul. Seria tolice esperar que poderíamos permanecer como monarquia no meio de repúblicas. Era inevitável que sucumbiríamos ao contágio republicano. Nosso imperador, que amamos, nada fez para evitar que tomássemos este curso. Ele é instruído, ou melhor, é um estudante compulsivo, que devora tudo e nada digere. Era esperado, já há um bom tempo, que ele abdicaria, mas não o fez. O Conde D'Eu permanece um estrangeiro para nós, e nós culpamos firmemente o imperador por não ter presidido a libertação dos escravos. O soberano não devia ter ficado ausente da execução. Além disto, o imperador não olhou cuidadosamente para as classes sociais do império. Por um longo tempo, os brasileiros o consideraram como um monarca amador. Ninguém parece ter interferido nesta luta, exceto aqueles que defendiam seus estatus e aqueles que preservavam as próprias cabeças.
Creio que brevemente virão excessos e, ao mesmo tempo, uma séria e permanente revolução.
A Bahia está insatisfeita. Outros a seguirão, não para restabelecer a monarquia, mas proclamar a própria independência.
Há luta entre as províncias, e nenhuma delas obedecerá outra. É uma federação de províncias republicanas que está sendo preparada, a princípio pobre e, subsequentemente, rica.
O império é demasiadamente extenso para pertencer apenas a uma fraca dinastia. Enquanto dividida, cada província fará esforços independentes e se tornará rica.
Espero que meus compatriotas respeitem a família imperial que, sem dúvida, entenderá que o melhor a fazer para o país é exilar-se.
Há um grupo a ser adicionado ao 'Rois en Exil'. Mas muitos países europeus odiarão adicionar novos.
Meu país é jovem. Não faz quatro séculos desde a sua descoberta. O império não tem mais do que setenta anos. A república era inevitável, e seria melhor que fosse estabelecida agora do que mais tarde."
O Barão de Penedo, o ministro brasileiro aqui, que não recebeu telegramas a respeito da revolução, foi entrevistado por um repórter francês. Expressou surpresa por vários monarquistas leais, incapazes de traição, estarem à frente dos líderes.
Os republicanos, ele diz, são uma pequena minoria, e o imperador é universalmente amado. O gabinete liberal de Preto [Visconde de Ouro Preto] sucedeu-se ao gabinete de Oliveira [João Alfredo Correia de Oliveira], e as eleições gerais deram-lhe uma maioria esmagadora.
O novo parlamento estava em perfeita tranquilidade. O Barão de Ladário, Ministro da Marinha, era muito impopular. Era hábil, mas bastante impetuoso, e, ano passado, quando tinha que adquirir um encouraçado na Europa, ele subitamente rompeu as negociações com a companhia Marseilles e negociou com a Inglaterra.
O almirante Van den Cock [na verdade, Wandenkolk. O jornal faz um erro aqui], era o líder descontente da marinha e, enquanto Ladário tornava-se interinamente Ministro da Guerra, o descontentamento espalhou-se pelo Exército.
Deodoro da Fonseca é um general que goza de muito prestígio e é muito popular no Exército. É dito que ele é invejoso da situação do Conde D'Eu lá.
Preliminarmente, ele atraiu a atenção por sua hostilidade ao governo e dois anos antes organizara uma demonstração que ficara prestes a se tornar um motim e somente falhou por falta de organização.
Após tais distúrbios, ele caiu em desgraça e foi enviado à fronteira do Paraguay para chefiar um destacamento.
Há pouco retornou ao Rio.
O senhor Benjamin Constant não é francês, e é uma pessoa de muito pouca importância no estado.
Ele é um notável matemático, sem dúvida, seu cárater rude e sua oposição ao governo tiraram-lhe todas as chances.
Como um jornalista de oposição, poderia ter uma certa popularidade, mas não há o que explique seu estatus no governo revolucionário.
O filho do Barão de Penedo, em resposta a um outro jornalista correspondente, repudiou a teoria de um jornal de Paris que os antigos senhores de escravos haviam fomentado a revolução.
A emancipação, diz ele, ganhou simpatizantes ao Império, e foi apoiada pelos republicanos.
O movimento foi pressentido e a tenacidade e a audácia dos republicanos era bem conhecida. Mas, pensou-se que esperariam até a morte do popular imperador.
Bruxelas, 17/11:
Descobri aqui que a revolução brasileira em favor da escravatura coincide de uma maneira singular coma Conferência Anti-Escravatura de Bruxelas.
Também prova que as mercadorias ilegais são embarcadas sob a bandeira da assim chamada República do Brasil, que não está representada na conferência.
Rio, 16/11:
Uma revolução eclodiu ontem aqui. O primeiro sinal de uma iminente inssureição foi uma revolta militar, quando alguns soldados dispararam três tiros contra o Barão de Ladário, Ministro da Marinha, que caiu seriamente ferido.
Não se sabe, num primeiro momento, se o movimento fora uma mera revolta ou uma grande revolução com aspectos políticos, mas, pela tarde, tornou-se claro que nada menos era do que a deposição do governo imperial e a proclamação da república.
O ministro, achando que o Exército apoiava a revolução, renunciou, e o governo provisório ficava estabelecido.
O general Deodoro da Fonseca, que não muito antes teve de aplicar medidas disciplinares por insubordinação e que fora enviado ao comando da província de Minas Gerais, é a principal figura no novo governo, que é composto como segue:
General Deodoro da Fonseca, presidente sem palácio;
Aristides Lobo, ministro do interior;
Quintino Bocayuva, ministro das relações exteriores;
Dr. Barboza [Ruy Barboza], ministro da fazenda;
Campos Salles, ministro da justiça;
Benjamin Constant, ministro da guerra;
Contra-almirante Vander-holtz [na verdade, Wandenkolk], ministro da marinha;
Demétrio Ribeiro, ministro da agricultura.
Dentre os membros do ministério, o senhor Bocayuva, o ministro das relações exteriores, é jornalista; Dr. Barboza é membro da câmara dos deputados, que foi dissolvida, e o senhor Constant é professor da Escola Politécnica do Rio de Janeiro e também um jornalista democrata.
O Conselho de Estado foi abolido. A opinião pública inclina-se a favor do novo governo, e a população está quieta.
As condições do Barão de Ladário não é considerara crítica. Acredita-se que as questões sobre a futura forma de governo será submetida a um plebiscito.
Meio-dia:
O governo provisório emitiu um manifesto declarando que a monarquia foi abolida. Anuncia sua intenção de evitar quaisquer discórdias e também declara que apoios têm chegado de várias províncias do Brasil.
O antigo premiê está detido. O imperador será tratado com a maior consideração.
16 horas:
O imperador desde o rompimento da revolução está preso em seu palácio em Petrópolis. Sua majestade recebeu a notícia de sua deposição e, ao mesmo tempo, foi informada de que sua pensão [civil list] estava em andamento. O imperador replicou que só se renderia à força.
A maioria das províncias parecer ter aderido à republica federativa proclamada pelos insurgentes nesta cidade. A província da Bahia, contudo, opôs-se ao movimento revolucionário.
O ministro republicano das finanças declarou que todos os contratos feitos pela administração imperial serão mantidos.
A cidade está calma.
O mercado está paralizado atualmente.
21 horas:
O imperador e a família real sairão [do país] para a Europa amanhã.
17/11:
O imperador partiu para a Europa no vapor desta manhã.
Nova Iorque, 16/11:
Notícias recebidas pelo comércio confirmam as declarações já feitas a respeito da revolução que eclodiu no Rio de Janeiro.
Uma destas comunicações diz que a Marinha e o Exército combinados depuseram o governo imperial , enquanto outra diz que a situação é crítica e que o imperador foi deposto.
O Evening Post, em notícia proveniente de Washington, publica as opiniões de um cavalheiro intimamente ligado a políticos brasileiros. Diz que a revolução é puramente militar, e é preocupante a falta de tropas fora do Rio de Janeiro para enfrentar os rebeldes.
A Força da capital tem aproximadamente 6000 homens, e o restante do Exército 10000 espalhados pelo país.
O general Deodoro da Fonseca foi acusado de insubordinação em julho último e o Ministro da Guerra propôs levá-lo à corte marcial, mas o imperador recusou-se a deixar que as coisas tomassem este curso.
Washington, 15/11:
O ministro brasileiro aqui, em resposta às perguntas feitas sobre as notícias de irrompimento da revolução no Brasil, declarou que tinha recebido um comunicado oficial sobre o assunto. Declarou que soubera do movimento republicano no Brasil, mas era de opinião que as lutas que se passaram por todo o país foram sobrestimadas, embora fosse possível que as coisas tivessem mudados nos últimos meses no país.
16/11:
O departamento de estado recebeu um comunicado confirmando o irrompimento da revolução no Rio de Janeiro e dos ferimentos do Barão de Ladário, Ministro da Marinha, pelas tropas revoltosas.
Lisboa, 17/11:
A corveta Bartholomeu Dias está pronta para zarpar para o Brasil.
Oporto, 17/11:
O Commércio [jornal português] publica um telegrama do Rio de Janeiro afirmando que o Visconde de Ouro Preto, o antigo premiê, foi intimado a deixar o país e embarcará hoje no vapor Ralilio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário